Disponível no site do CLAM -http://www.clam.org.br/publique/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?UserActiveTemplate=%5FBR&infoid=7968&sid=7
O II Encontro Nacional da Articulação de Mulheres Brasileiras (ENAMB), realizado entre os dias 30 de março e 02 de abril em Brasília, discutiu o panorama de atuação da Articulação das Mulheres Brasileiras (AMB), os desafios e o contexto do feminismo nacional a partir da eleição da primeira mulher como presidente da República. O evento contou com a participação de mais de 700 mulheres de 24 estados e produziu uma série de recomendações a serem apreciadas em junho pelo Comitê Político da AMB. Segundo Guacira César, diretora do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (CFEMEA), foram debatidas formas de articulação com o feminismo na América Latina, maneiras de financiar o movimento brasileiro e a necessidade de um plano de ação nacional para nortear as ações das feministas. A ocupação da Presidência da República por uma mulher pela primeira vez foi destaque no evento. “Uma mulher no posto mais elevado é uma conquista do movimento, pois foi através dele que se propiciou às mulheres serem sujeitos políticos. Foi uma luta de décadas”, afirmou Guacira César. Para a secretária-executiva da AMB, Analba Brazão, a presidente Dilma Rousseff sinalizou uma mudança política considerável ao dar posse para nove ministras e ocupar grande parte do segundo escalão do governo federal com mulheres. “Ela é uma mulher de trajetória de esquerda e, embora não tenha construído sua história política dentro do movimento feminista, está articulada com os princípios de Direitos Humanos”, afirmou, fazendo, no entanto, ressalvas quanto às prioridades do governo. “Durante a campanha presidencial do ano passado, houve um forte recuo em relação ao Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3), à união civil de pessoas do mesmo sexo e ao aborto. Compreendemos a situação por conta da conjuntura eleitoral do momento. O governo está no começo e, mesmo com a figura de uma mulher no cargo mais elevado, não podemos fechar os olhos para o que consideramos equivocado. Sabemos que o fato de ser mulher torna a presidente Dilma mais vulnerável a críticas. Mas, por exemplo, a prioridade absoluta defendida pela presidente é erradicar a pobreza e a miséria. Nós, do movimento, estamos atentas para ver como tal propósito estará articulado com as questões de gênero e raça”. Durante o Encontro, foi consensual que há inúmeros desafios a serem debatidos e enfrentados, conforme observa a diretora do CFMEA. “Chamamos a atenção para as muitas políticas públicas débeis e frágeis voltadas ao combate às desigualdades de gênero. As diretrizes de muitas ações de governo ainda são pautadas pela idéia da mulher dedicada à família, uma concepção que chamamos de ‘familista’. Há outras possibilidades de estrutura, de organização, de relacionamento. A mulher não é um objeto nascido exclusivamente para a família”, criticou Guacira César. A questão racial esteve presente nas discussões. A maioria das participantes era negra, muitas quilombolas. O encontro marcou o lançamento de uma campanha pelo fim da violência contra as mulheres negras. “É um segmento da população vítima de uma dupla violência: aquela referente à arbitrariedade de gênero e dominação masculina e aquela relacionada ao racismo. É fundamental que o movimento e o poder público estejam atentos e mobilizados para combater tal situação”, afirmou Analba Brazão, da AMB. De acordo com a secretária executiva da AMB, o recente caso do deputado federal Jair Bolsonaro, acusado de racismo após declarações a um programa de televisão brasileiro, é ilustrativo da existência de concepções preconceituosas. “Foi um ato misógino e racista. Penso que o combate ao racismo envolve não apenas a execução de políticas públicas, que são fundamentais, mas também a mudança de mentalidade da sociedade. É preciso ações de contracultura, medidas educativas desde a infância para estimular a mudança no jeito de ser dos indivíduos”, defendeu Analba Brazão. Outro tema presente no Encontro foi a laicidade do Estado. “A influência da religião em nossa sociedade implica em desrespeito aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, sobretudo na questão da legalização do aborto”, enfatizou a diretora do CFEMEA. De acordo com ela, as eleições de 2010 promoveram um recuo nos debates sobre a interrupção da gravidez. “Em 2004, foi lançado um Plano Nacional de Política para Mulheres no qual uma das prioridades era discutir e revisar a legislação punitiva sobre a interrupção voluntária da gravidez. No entanto, a forma como o tema do aborto foi tratado na campanha do ano passado representou um passo atrás”, afirmou Guacira César, lembrando que o crescimento da bancada religiosa no Congresso Nacional indica o grau de dificuldades a serem enfrentadas na atual legislatura. Apesar do quadro adverso, a diretora do CFEMEA afirma que o movimento feminista continua atuante e mobilizado. “Mesmo com as dificuldades em apoios e as resistências conservadoras, temos que resistir e nos unir para lutar contra o modelo patriarcal e racista. O movimento é diverso, envolve camponesas, negras, lésbicas, sindicalistas, mulheres das mais distintas origens e profissões. Portanto, somos um grupo representativo e temos muita disposição política para construir uma sociedade justa”. |
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